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Por muito tempo, a ideia de “cânone literário brasileiro” foi apresentada como uma lista neutra e consensual dos autores mais relevantes da nossa história. O que não se dizia (ou se dizia pouco) é que essa lista foi construída dentro de estruturas que refletem e perpetuam desigualdades históricas de gênero, raça e classe social.
Os livros que entraram para o cânone foram, majoritariamente, escritos por homens brancos de classe média ou alta, vindos dos grandes centros urbanos, especialmente do eixo Rio-São Paulo. E os livros que ficaram de fora? Escritos por mulheres, por autores negros, indígenas, periféricos. Escritos à margem. Escritos sobre outras experiências que não se encaixavam na ideia eurocentrada do que era “literatura séria”.
Essa exclusão não é acidental — ela é parte de um projeto cultural de apagamento.
📉 A matemática do apagamento: quem (não) está no cânone?
Um dos casos mais emblemáticos dessa desigualdade está em uma das antologias mais conhecidas do país: Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século, organizada por Italo Moriconi e publicada em 2001. Dos cem poemas selecionados, apenas 12 são de autoria feminina. Nenhuma mulher negra foi incluída. Nenhuma escritora indígena. Nenhuma autora do norte ou do centro-oeste do país.
Essa desproporção não é só estatística: ela evidencia o filtro histórico que decide quem entra ou não na “biblioteca oficial” da nossa literatura. Escritoras como Maria Firmina dos Reis, Carolina Maria de Jesus, Hilda Hilst, Cora Coralina e Conceição Evaristo foram por muito tempo ignoradas ou relegadas a “curiosidades” literárias, enquanto nomes masculinos ocupavam o centro do debate e das estantes escolares.
📚 “Literatura feminina” ou “literatura menor”?
A exclusão das mulheres do cânone não se dá apenas pela ausência de seus nomes nas listas. Muitas vezes, mesmo quando reconhecidas, elas são enquadradas como “escritoras de nicho”, tratadas como exceções ou como autoras de “literatura sentimental”, “íntima”, “doméstica” — rótulos que diminuem o valor universal e estético de suas obras.
Como se escrever sobre o corpo, a maternidade, o desejo ou a experiência feminina não fosse literatura com L maiúsculo. Como se só o que parte da vivência masculina pudesse ser considerado relevante para “a condição humana”.
E esse olhar reducionista não atinge apenas as mulheres — ele se estende a autores negros, indígenas, trans, LGBTQIA+, pobres, nordestinos, periféricos. Muitos escrevem há décadas, com profundidade estética e impacto social, mas seguem invisíveis para o circuito dos grandes prêmios, para as editoras tradicionais e para as salas de aula.
🏆 Os prêmios também têm um perfil
Essa desigualdade se reproduz nos grandes prêmios literários brasileiros. Segundo levantamento do portal Teoria e Debate, até 2020, apenas 15% das indicações ao Prêmio Jabuti na categoria Romance foram para mulheres. A presença de pessoas negras, então, é ainda mais escassa — e, quando acontece, é tratada como “novidade” ou “tendência”.
Essa disparidade revela que ainda hoje persiste a ideia de que literatura escrita por mulheres ou por pessoas racializadas é “menos universal”, como se suas experiências não fossem dignas de representar a cultura brasileira.
Mas quem define o que é universal?
📌 O cânone está em disputa — e precisa estar
Rever o cânone não é apagar autores consagrados. É questionar por que tantos outros foram apagados. É perguntar: quem teve acesso à publicação? Quem foi resenhado? Quem teve seus livros adotados nas escolas? Quem foi ouvido pela crítica? E, principalmente: quais vozes ainda estão sendo deixadas de fora?
Literatura é memória, mas também é poder.
Quem escreve entra para a história — mas quem é lido molda o presente.
Rever o cânone é uma forma de corrigir rotas, de reconhecer a pluralidade da produção literária brasileira e de criar novos espelhos para as próximas gerações.
✊ Leitura como gesto político
Ao buscar e ler autoras e autores que foram silenciados, você amplia seu repertório e confronta o sistema que por tanto tempo restringiu a literatura a poucos nomes e olhares. Ler Maria Firmina dos Reis, Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus, Eliane Potiguara, Monique Malcher, Jéssica Iancoski, Dia Nobre, Bruna Mitrano, entre tantos outros, não é só um ato literário — é um gesto político.
Porque o cânone pode ser tradição.
Mas também pode ser transformação.