A literatura paranaense é uma das mais vibrantes e complexas do cenário brasileiro. Situado entre o Sul industrializado e o Brasil profundo, o Paraná abriga uma produção literária que carrega em si tanto a força das raízes quanto o impulso pela inovação. Sua poesia transita entre o clássico e o experimental, entre o interior e o urbano, entre o popular e o erudito. O estado é berço de nomes fundamentais para a história da poesia nacional — de Julia da Costa, no século XIX, a vozes contemporâneas como Jéssica Iancoski, Mabelly Venson e Estrela Leminski.
A diversidade é uma das marcas centrais da poesia feita no Paraná. Poetas indígenas, negros, mulheres, pessoas LGBTQIA+ e periféricas têm encontrado nos versos um espaço legítimo de expressão e resistência. Além dos nomes já canonizados, há uma cena pulsante que vem ganhando força através de editoras independentes, coletivos literários, saraus, slams e plataformas digitais. Essa pluralidade de origens, temáticas e linguagens é o que torna a poesia paranaense uma das mais relevantes do Brasil contemporâneo.
Outro traço característico da produção poética do estado é o diálogo entre diferentes tradições. O simbolismo de Emiliano Perneta encontra eco na delicadeza dos haicais de Helena Kolody, enquanto a ruptura linguística de Paulo Leminski reverbera nas performances poéticas de autores contemporâneos. A literatura do Paraná é também marcada pela presença da oralidade — seja na poesia indígena de Olívio Jekupé ou nas narrativas das periferias de Curitiba, como na obra de Kandiero. Assim, o estado constrói uma poesia que honra o passado ao mesmo tempo que aponta para o futuro.
O reconhecimento da literatura paranaense no cenário nacional tem crescido nas últimas décadas. Poetas como Luci Collin e Alice Ruiz conquistaram prêmios importantes, como o Jabuti e o Biblioteca Nacional. Além disso, a presença ativa de autoras e autores do estado em antologias, feiras literárias e projetos de formação tem consolidado o Paraná como um polo criativo e formador de leitores. É uma poesia que não se limita às fronteiras do estado, mas que carrega consigo a força do território.
Neste artigo, reunimos os 15 maiores poetas paranaenses de todos os tempos, considerando suas contribuições estéticas, históricas e culturais. A lista prioriza a diversidade de estilos, épocas e identidades, reconhecendo que a grandeza da poesia paranaense está justamente em sua pluralidade. Que este conteúdo sirva como um mapa para quem deseja conhecer mais profundamente a literatura feita no Paraná — e talvez se encontrar nela também.

1. Paulo Leminski
Doi um dos grandes nomes da literatura brasileira do século XX. Poeta, ensaísta, romancista, tradutor, compositor, publicitário e professor, foi também faixa‑preta de judô e crítico literário. Sua obra é profundamente influenciada pelo concretismo e pela poesia japonesa (especialmente Matsuo Bashō), marcada por poemas breves, haicais, trocadilhos, gírias e humor irreverente. Publicou coleções emblemáticas, como Caprichos e Relaxos (1983) e Distraídos Venceremos (1987), e teve a obra La Vie en Close reunida postumamente em 1991. No campo da prosa, destacou-se com o romance experimental Catatau (1975) e o romance Agora é que são elas (1984). Como tradutor, Leminski trouxe ao português autores como James Joyce, Samuel Beckett, Alfred Jarry, Yukio Mishima, John Lennon, além de traduzir e biografar Bashō. Também compôs letras para artistas renomados como Caetano Veloso, Ney Matogrosso e Gilberto Gil, expandindo o diálogo entre literatura e música. Sua linguagem inventiva, síntese formal, humor e fusão entre erudito e coloquial romperam fronteiras, ampliando o alcance da poesia no Brasil e influenciando gerações posteriores.
2. Alice Ruiz
Poeta, haicaísta, publicitária, letrista e tradutora. Desde os anos 1980, consolidou-se como referência do haicai em língua portuguesa e lançou mais de 20 obras, entre elas Navalhanaliga (1980), Desorientais (1996) e Dois em Um (2008), escrito em parceria com Paulo Leminski. Vencedora do Prêmio Jabuti de Poesia em 1989 (Vice Versos) e em 2009 (Dois em Um), escreve também letras de música para artistas como Itamar Assumpção, Arnaldo Antunes, Zélia Duncan e Adriana Calcanhoto. Sua poesia, marcada por delicadeza, crítica, erotismo e espiritualidade, demonstra profundo domínio da forma breve e da sugestão poética.
3. Luci Collin
Poeta, ficcionista, tradutora e professora aposentada da UFPR, onde atuou no Curso de Letras e hoje colabora com pós-graduação em Tradução (PUC‑PR). Autora de livros como Estarrecer (1984), Rosa que está, O tempo em estado sólido, Apropriações de uma máquina de escrever e A palavra algo, foi vencedora do Prêmio Jabuti e finalista do Oceanos. Como contista, publicou Inescritos e Dedos impermitidos (Prêmio Clarice Lispector – Biblioteca Nacional, 2022).
Também tradutora de poetas como E. E. Cummings, Gertrude Stein e Seamus Heaney, desenvolve uma obra que explora os limites da linguagem, a sonoridade do texto e o pensamento poético, sendo reconhecida como referência na poesia e tradução experimental no Brasil. Professora e orientadora, idealizou projetos como o “Concurso Literário Luci Collin” na UFPR, influenciando gerações de escritores. Ocupa a Cadeira 32 da Academia Paranaense de Letras.
4. Helena Kolody
Poeta, professora e tradutora, filha de imigrantes ucranianos. Em 1941, com Paisagem Interior, tornou-se a primeira mulher a publicar haicais no Brasil, inaugurando sua carreira poética — estilo que praticou com concisão, espiritualidade e olhar contemplativo. Ao longo de décadas, publicou mais de 15 livros, entre eles Infinito Presente e Revoada, além de antologias e coleções completas. Reconhecida pela Academia Paranaense de Letras e pela comunidade nipônica como “haicaísta”, ela se tornou símbolo da poesia paranaense. Sua escrita, marcada por linguagem econômica, introspecção e espiritualidade, abriu caminho para o haicai no país e valorizou o olhar feminino na poesia do século XX.
5. Jéssica Iancoski
Poeta, editora, artista visual e fundadora da ONG-Editora Toma Aí Um Poema, Jéssica Iancoski é uma das vozes mais marcantes da literatura contemporânea brasileira. Finalista do Prêmio Jabuti de Poesia e vencedora do Prêmio Candango de Literatura (Capa), publicou obras como América Xereca, A Pele da Pitanga e Fábulas de Anansi. Sua escrita aborda temas como identidade, corpo, território, gênero e linguagem, articulando experimentação estética e engajamento político. Além da produção literária, atua como formadora e curadora em projetos culturais, promovendo a publicação de autoras(es) de grupos minorizados. Sua contribuição ultrapassa os livros: é também um projeto de transformação do mercado editorial.
6. Mabelly Venson
Escritora e editora na Toma Aí Um Poema. Publicou seu primeiro livro pela própria TAUP e, pouco depois, passou a integrar a equipe como editora. Desde então, tem se dedicado integralmente à literatura, participando de editais e abrindo caminhos possíveis para si e para outros escritores. É conhecida como “parteira de livros” — por acompanhar nascimentos literários com cuidado e escuta. Sua escrita parte do corpo-mulher e trata de tudo o que o atravessa: memória, desejo, dor e cura.
7. Julia da Costa
Poeta e escritora brasileira, reconhecida como a primeira mulher paranaense a publicar um livro de poesia. Ainda criança mudou-se para Santa Catarina, onde lançou sua coletânea Flores Dispersas em 1867 (com volumes em 1868) e contribuiu com poemas, crônicas e artigos em jornais e revistas do século XIX. Sua poesia, marcada pelo romantismo europeu, aborda melancolia, saudade, amor, natureza e a busca pela afirmação feminina em uma sociedade patriarcal. Casou-se por imposição aos 26 anos, viveu uma apaixonada correspondência com o poeta Benjamin Carvoliva e, após a morte do marido, isolou-se até falecer em 1911. Com coragem e talento, abriu caminhos para futuras escritoras no Brasil.
8. Emiliano Perneta
Foi advogado, poeta, professor, jornalista e um dos principais introdutores do Simbolismo no Brasil. Atuou em periódicos como O Dilúculo, fundou a Folha Literária e colaborou com grandes jornais, divulgando estéticas refinadas, musicais e espiritualistas, com forte influência de Baudelaire. Sua obra poética — especialmente Ilusão (1911), lançado na Ilha da Ilusão no Passeio Público — consolidou seu título de “Príncipe dos Poetas Paranaenses”. Publicou também Pena de Talião (1914) e, postumamente, Setembro (1934). Entre 1913 e 1918 presidiu o Centro de Letras do Paraná, contribuindo decisivamente para a consolidação da vida literária em Curitiba. Hoje é patrono da cadeira 30 da Academia Paranaense de Letras, tendo legado reconhecimento simbólico, cultural e físico — como ruas e bustos em sua homenagem.
9. Adélia Maria Wolner
Escritora, poeta, advogada e professora universitária. Formada em Direito pela UFPR, exerce forte presença na cena literária paranaense. Membro da Academia Paranaense de Letras (cadeira 15), da Academia da Poesia, do Centro de Letras do Paraná (que presidiu de 1997 a 1999) e do Centro Paranaense Feminino de Cultura, ela também atuou como crítica literária e organizadora de suplementos e antologias que destacaram novos(as) autores(as). Após estrear com O Trovismo (1978), publicou obras como Avesso Meu (1990), Infinite in Me (1997) e Luzes no Espelho (2008), explorando memória, sensibilidade feminina e o cotidiano com linguagem humana, delicada e reflexiva. Embora seu trabalho seja mais reconhecido regionalmente, sua contribuição foi decisiva para fortalecer a poesia contemporânea no Paraná.
10. Assionara Souza
Escritora, contista, poeta, dramaturga e pesquisadora em Estudos Literários (UFPR). Atuou na organização de antologias e projetos como “Translações: Literatura em Trânsito” (2014), participou do coletivo Escritoras Suicidas e colaborou com a revista Germina. Publicou volumes como Cecília não é um cachimbo (2005), Amanhã. Com sorvete! (2010), Os hábitos e os monges (2011), Na rua: a caminho do circo (2014) e o livro de poesia Alquimista na Chuva (2017). Sua obra póstuma, Instruções para morder a palavra pássaro, foi lançada em 2022. Sua escrita, permeada por textos reflexivos e líricos, transitou entre prosa poética, contos e teatro. Embora sua influência tenha sido mais marcante no cenário paranaense, tornou-se referência para a produção literária contemporânea de mulheres.
11. Emilio de Menezes
Foi jornalista, cronista, sonetista e poeta parnasiano, célebre por sua sátira mordaz e presença no jornalismo boêmio da Belle Époque carioca. Com colunas humorísticas e sonetos ácidos assinados sob diversos pseudônimos, tornou-se um dos principais poetas satíricos do Brasil, sendo comparado a Gregório de Matos. Eleito em 15 de agosto de 1914 para a cadeira 20 da Academia Brasileira de Letras, nunca chegou a ser empossado — recusou alterar seu discurso inaugural, considerado excessivamente crítico. Sua obra ajudou a colocar o Paraná no circuito literário nacional de começo de século, mantendo viva sua herança paranaense no coração do Rio de Janeiro.
12. Olívio Jekupé
Poeta, contista, professor e ativista indígena da etnia Guarani. Reside em Araquari (PR) e também em aldeias Guarani no estado de São Paulo. Escreve em português e guarani, dando voz à cultura indígena, ancestralidade, tradição oral e luta pelo direito à terra. Entre seus títulos estão A mulher que virou Urutau (2011) e O presente de Jaxy Jatere (2017), ambos bilíngues. Pioneiro da literatura indígena contemporânea, sua obra circula em escolas, universidades e eventos em todo o Brasil, consolidando a literatura de tradição oral como parte essencial da cultura nacional.
13. Gloria Kirinus
Poeta, ensaísta, tradutora e professora universitária. Vive em Curitiba desde 1970. Formada em Turismo no Peru, Letras‑Português e Espanhol na UFPR, com mestrado pela PUC‑RJ, doutorado pela USP e pós‑doutorado em Paris, ela lecionou em cursos de Didática, Tradução e Literatura Infantil/Infantojuvenil na UFPR e PUCPR. Sua obra bilíngue (português e espanhol) abrange literatura infantil e juvenil, poesia lírica e livros teóricos. Entre os títulos poéticos estão Círculo das Águas e Fio de Corte. Como ensaísta e professora, publicou obras sobre formação de leitores e “poesia na infância”. Curou antologias e projetos literários; criou a oficina “Lavra‑Palavra” de criação lírica; colaborou com crônicas, poesias e ensaios no Caderno G da Gazeta do Povo. Sua escrita intercultural explora exílio, migrância, feminilidade, memória, infância, linguagem e identidade, contribuindo significativamente para a literatura latino‑americana em Curitiba.
14. Kandiero
Poeta, educador, performer e produtor cultural da periferia de Curitiba. Voz ativa da literatura negra no Paraná, ele articula saraus, slams e projetos comunitários que envolvem poesia falada, ancestralidade afro-brasileira, resistência e espiritualidade. Como slammaster e mediador cultural, usa a oralidade como instrumento de transformação social. Em 2024 lançou o livro de poemas Curitiba me lembra Palmares (Humaitá), reunindo versos sobre memória urbana, religiões de matriz africana e as invisibilidades da história paranaense. Idealizador do Centro Cultural Humaitá, participou da doação da “Estante Afro – Maria Águeda” na Biblioteca Pública do Paraná, incorporando mais de 500 obras de autores negros ao acervo. Sua atuação fortalece o movimento de literatura marginal e periférica no sul do Brasil.
15. Estrela Leminski
Escritora, poeta, cantora e compositora, filha dos poetas Paulo Leminski e Alice Ruiz. Formada em Música Popular Brasileira (Faculdade de Artes do Paraná) e mestre em Musicologia (Valladolid, Espanha), ela desenvolveu o projeto musical Leminskanções em 2014, resgatando composições do pai. Estreou como autora com Cupido, cuspido, escarrado (2004) e, em parceria com Téo Ruiz, lançou o álbum Tudo Que Não Quero Falar Sobre Amor (2017), que mistura lirismo pop, temas afetivos e rupturas emocionais, com videoclipes lançados em veículos como a Billboard Brasil. Atuante na cena cultural curitibana, Estrela também organiza e curadoria projetos musicais-literários que aproximam poesia e performance. Sua trajetória dá continuidade — e reinventa — o legado da família Leminski, conferindo à tradição poético-musical um olhar contemporâneo, sensível e irreverente.