Jaime Jr. —
O que deixei
Nas distâncias já percorridas nesta vida
Conhecendo pessoas e lugares
Colecionando lembranças e esquecimentos
Estando apenas de passagem
Deixando um rastro de memórias
E um pouco de saudade
*
Lê gado!
Deixarei o meu prazer
Para aquela que me fez sofrer
Esse meu abrigo
Vai para meu inimigo
Minha cadeira favorita
Fica com moça bonita
Os quadros que pintei
Para quem eu ainda não sei
Já a máquina de escrever
Eu deixo para quem quiser ver
Minha coleção de discos antigos
Fica para meus amigos
Os livros que escrevi
Ah! Esses eu já deixei!
Flavia Ferrari —
Testamento
Para a minha mulher eu deixo as minhas inspirações
São muitas e algumas muito belas
Você pode ficar com elas todas
Ou até distribuí-las se esta for a sua vontade
Para o meu homem eu deixo as minhas músicas prediletas
Que você possa escutá-las quantas vezes desejar
São todas suas
TODAS somente suas
E para você meu grande amor
Deixo os meus sonhos
Que você possa absorvê-los sem pressa
Alguns hão de te surpreender
Como você a mim
Quando chegou perto e resolveu ficar
Até o fim agradeço por termos existido simultaneamente em alguns instantes
Que foram tão doces e tão poucos
Géssica Menino —
Deixar I
Deixar que o amor floresça;
Deixar que a criança cresça.
Deixar mais que um Império;
Deixar mais que títulos – a cultura, a arte, a sabedoria.
Deixar saudades no peito;
Deixar as boas lembranças do eu sujeito.
Deixar um testamento de que ainda vivo;
Deixar bem explícito que só morrerei contigo.
Deixar nos mistérios da vida, uma queixa de um
Deixar dissimulado e fugidio de quem ainda espera.
*
Deixar II
Deixar escrito na pele, aquela tatuagem fugidia;
Deixar registrado no cartório nossos nomes de orgia.
Deixar na caixa das lembranças, as nossas teias;
Deixar que nossos ancestrais fluem em nossas veias.
Deixar aquele poema vago e vazio, titubeando entre nossos afagos;
Deixar escrito o teu nome nas premissas de orago.
Deixar a janela aberta em espera daquela brisa;
Deixar que aquela lufada de vento refresque a nossa partida.
Deixar que a vida percorra os nossos caminhos;
Deixar contigo a chave do cofre das memórias do ninho.
*
Neusa Doretto —
” Deixadas” ( Crônica )
Deixaram calcinha
Moleton e blusas
Saíram às pressas ou achavam que voltariam. Uma voltou. A outra sumiu no infinito ,mas continuam aqui , no meu armário , fazendo parte da minha cabeça e do meu calendário de mulheres. As mulheres , todas , me mimaram muito. E tanto que para amar de novo preciso de roupas pelo caminho , intimidade de pele e hálito. Preciso de cheiro bom . Cheiro de me sentir em casa. Elas me deixaram assim: preguiçosa , deixando um outro amor para depois.
*
Ronaldo Rhusso —
Meu deixar semanal…
Deixo ali mais uns meninos
rindo, olhando uns aos outros
e mostrando seus cadernos
como se neles tivessem
obras primas das mais raras,
mas, de fato, até que é fato:
aprenderam escrever
nada mais que próprio nome
e eis apontam para o feito
dizem “Tio, sou eu aqui!
Não tem letras mais bonitas
do que essas do meu nome”…
Deixo a moça sentadinha
lá no píer abraçando
os joelhos, mas sorrindo.
Seu tchauzinho me comove.
Descobriu-se diferente,
se travou dentro de si,
teve medo, quis morrer;
quis sumir em meio à mata
não tão virgem como dizem,
mas mostrei-lhe umas fotos
de pessoas “parecidas”
e que vivem sem temer,
pois é belo o ser diverso…
Deixo gente que me odeia
por que levo diferença,
esperança e quase sonhos
para quem já nem sonhava…
Deixo lágrimas descerem
se juntando ao rio escuro,
pois sozinho choro livre
e meu corpo diz à mente
que foi bom deixar de mim
mais um pouco e o barqueiro
já conhece o meu sentir,
pois deixei na outra Vila
mais pedaços de euforia
e me alerta: “-Homi, calma!
Come um pouco e te distrai.
Esse rio é tua estrada.
Deixa estar, segunda feira
tem, depois de Aritaguá,
Vilarejo e Juerana,
O Retiro, Assentamento,
Jairi, Sapucaeira…
Vão ser uns difíceis!
Deixa estar! Esses meninos
vão crescer e te esquecer,
é capaz de outros virem
desmanchar o teu trabalho,
mas agora, vai, descansa,
pois em pouco a gente chega
na Lagoa Encantada,
onde já tem o teu rastro;
onde dormes sono justo
onde sonhas e as dores
deixam tu sentindo a paz
que termina com o canto
do galinho garnizé
da senhora Albertina
que te deixa rir com “causos”
repetidos, mas alegram
e deixam mais feliz…
*
Rozana Gastaldi Cominal —
HERDADE VITAL
I
tempo que aprisiona
hora fugidia e furiosa
cegueira que castiga
nossa própria humanidade
que segue em tempos de guerra
II
família, sabor, saber
amor pela arte
provocações e inquietações
memórias do vivido e imaginado
jazem em tempos de paz
III
sorriso na lembrança
livros em caixas, estantes
cinzas ao pé da pitangueira
rosa etérea desponta
no jardim acolhedor
Jéssica Iancoski —
LITERATURA
esquecidos na mudança — deixei para trás a casa
o quarto da criança e os últimos anos da infância
justo no ano que me impôs o fim na primeira década
costuraram em mim a primeira linha cadavérica
passei a sonhar com a morte: tão serena vestido lilás
dizendo-me para deixar — também — a dor para trás
e pensei no meu irmão: tão pequeno e tão sozinho
ainda a contar nos dedos os seus primeiros medos
depois gentilmente fechei a felicidade nas pálpebras
assim: como aquele que para sempre deixa de ser
por fim, da minha criatura, transmutei um novo mundo
para que vivêssemos ingênuas crenças frente ao absurdo
Taciana Valença
diz:Toma um poema! E eu achei que seria um, mas me vi banhada de dilemas, como quem se banha ao sol, só que de poemas. Tudo lindo aqui. Parabéns, poetas!
Ronaldo Rhusso
diz:<3
Flavia
diz:Parabéns poetas! Que eu alegria ler esta publicação compartilhada!
Rozana Gastaldi Cominal
diz:A gente aprende tanto quando se permite partilhar, deixar nosso testemunho, nosso testamento em vida….
Ronaldo Rhusso
diz:Ficou lindo!!! Esse Grupo de poetas sempre deixa seu recado favorecendo o Tema! Parabéns a todos!!!