Uma Tarântula de Meio Século, por Ramon Felipe

Capa do livro Tarântula, de Bob Dylan, publicado no Brasil pela Editora Tusquets em 2017. A obra conta com tradução de Rogério W. Galindo e foi lançada em edição brochura, com 136 páginas. ISBN: 9788542209365.
Capa do livro Tarântula, de Bob Dylan, publicado no Brasil pela Editora Tusquets em 2017. A obra conta com tradução de Rogério W. Galindo e foi lançada em edição brochura, com 136 páginas. ISBN: 9788542209365.

Entre discos, um acidente de moto e muitas interrogações, Bob Dylan apresentou Tarântula.

Voltando de um aniversário, não pude deixar de pensar no número 54. Quase onipresente, ele estava na parede da residência, na placa do táxi que me trouxe de volta, na figura do meu antigo professor de química, no bolo do aniversariante e no cálculo que me fez subtrair os anos e me levou ao ano de 1971. Não lembro qual foi a canção mais tocada naquele ano, mas em 1972 foi “Heroes”, de David Bowie. Em meados de 1970 e 1971, algo que movimentou a cena cultural foi a grande incógnita acerca daquilo que seria a primeira publicação de Robert Zimmerman — ou, para nós, Bob Dylan.

Ao longo dos anos 60, o jovem vindo de Minnesota se tornou um ícone da contracultura com seu folk rock e, principalmente, por letras que iam do protesto ao lirismo. De antemão, aviso que as palavras anteriores são o mais próximo de uma classificação para Dylan, pois quem pode realmente definir essa figura enigmática? Tal ideia é fundamental para abordar Tarântula. É poesia? Prosa poética? Romance? Um pouco de tudo — tudo o que passou pela mente do bardo entre os álbuns Bringing It All Back Home (1965), Highway 61 Revisited (1965) e Blonde on Blonde (1966).

Durante esse período, Dylan escreveu letras que flertavam com o surrealismo de Rimbaud, unindo figuras famosas, críticas contundentes e imagens que escapam a classificações fáceis. Lançado em meio a especulações e adiado por um acidente de moto, Tarântula gerou ainda mais curiosidade antes mesmo de ser publicado.

Claro, não foi Tarântula que garantiu a Dylan o Nobel de Literatura em 2016 — talvez Crônicas: Volume 1 seja uma leitura mais fluida. Mas há em Tarântula um retrato bruto, inquieto e genuíno de um artista em trânsito criativo. Entre digressões, paródias e lampejos poéticos, o livro convida o leitor a uma travessia desconfortável e fascinante.

Sendo sincero, eu voltaria no tempo para vivenciar a experiência de aguardar esse livro, ver as ecobags promocionais com o rosto do jovem Dylan estampado junto da palavra Tarântula.

Para encerrar — e sem abandonar a mística do número 54 — evoco palavras encontradas na página 54, que resumem bem uma faceta do autor:

tchau por enquanto
seu homem-relâmpago


📌 Resenha escrita por Ramon Felipe. Publicado com autorização do autor.
Ramon Felipe nasceu em Natal, capital do Rio Grande do Norte, no final do século XX. Graduado em Letras e pós-graduado em Docência no Ensino Superior, o professor dedica-se à poesia enquanto poiesis, isto é, ao processo de criação e ao exercício metalinguístico/intertextual.

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