
Publicado em 2021 pela Editora Patuá, o livro :Parabólica, de Juliana Abdon, apresenta-se como um gesto poético que também é visual: além dos versos, o livro é atravessado por fotografias feitas pela própria autora, compondo um diálogo íntimo entre palavra e imagem.
Dividido em quatro capítulos — Caminhos pra lugar nenhum, Perto-longe, Memórias objetais e algo mais e O vagão está vago — o livro sugere uma travessia de deslocamentos, pausas e estranhamentos, sempre guiada por um olhar capaz de enxergar poesia nas coisas miúdas, nos gestos banais e até nos objetos esquecidos do cotidiano.
No primeiro capítulo, Caminhos pra lugar nenhum, a autora revisita o tema do percurso e da perda como potência criativa. O poema em que declara:
“Havia um mapa
Mas o lugar mudou de lugar
E o mapa se perdeu na mudança”
nos coloca diante de uma cartografia em constante deslocamento, na qual o sentido não está em chegar, mas em se perder para talvez se encontrar.
Essa dimensão de viagem sem destino se conecta ao último capítulo, O vagão está vago, onde o movimento ganha corpo na imagem do trem e de seus passageiros. Em um dos poemas, lemos:
“vagou léguas e léguas
na linha do trem
um dia dormiu
e acordou vagão”
Aqui, o eu lírico já não é apenas quem caminha ou observa, mas quem se transforma em parte da própria engrenagem do movimento, metáfora para a poesia de Juliana: um deslocar-se constante entre sentidos, imagens e formas.
Entre um extremo e outro, os capítulos Perto-longe e Memórias objetais e algo mais trazem a delicadeza da observação do mundo natural e urbano, bem como a escuta dos objetos que ganham voz e memória: “Sou arqueóloga das lembranças objetais / cada coisa possui um valor só seu”. Essa sensibilidade reverbera nas fotografias inseridas no livro, em que fragmentos do cotidiano se tornam também registros poéticos.
Com delicadeza e vigor, :Parabólica é um livro que convida à deriva, ao olhar atento e à surpresa, como quem percorre um mapa instável, em que cada curva pode revelar um novo mundo.