O Que é Qualidade Literária? Um Debate Entre Elitismo e Cultura Popular

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Por muito tempo, o que é ou não é literatura de qualidade foi decidido por um grupo muito restrito de pessoas — geralmente homens, brancos, acadêmicos, leitores de Joyce e Proust, habitantes do centro do país e frequentadores de clubes literários fechados.
Mas será que essa régua ainda faz sentido?
E mais: será que ela algum dia fez?

No coração do debate está a tensão entre o que se convencionou chamar de “alta literatura” — experimental, densa, “difícil” — e a chamada literatura de entretenimento — fluida, acessível, popular. De um lado, o cânone. Do outro, o best-seller. E no meio disso tudo, milhares de leitores e escritoras sendo desqualificados por gostarem do “errado”.

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🧐 Quem tem medo do best-seller?

Recentemente, um clube de livros causou polêmica ao classificar suas obras como “alta literatura” ou “literatura de entretenimento” — como se fossem categorias fixas e mutuamente excludentes. A crítica foi imediata: por que ainda insistimos em uma hierarquia que coloca a leitura prazerosa como inferior?

Um livro muito vendido pode ser bom?
Essa pergunta, embora pareça ultrapassada, continua rondando os corredores das bienais, das universidades e dos editoriais. O preconceito contra gêneros como fantasia, romance LGBTQIA+, young adult (YA), romance de época ou policial ainda é enorme — como se não houvesse densidade emocional, construção estética ou crítica social possível nessas formas narrativas.

Mas a verdade é que muitas das leituras mais significativas da vida das pessoas vêm desses gêneros populares. Não à toa, é por eles que muitos leitores entram no mundo da literatura. Então por que seguimos tratando essas obras como “inferiores”? Talvez porque não foi a academia quem deu o selo.


📚 O selo invisível da crítica “séria”

Durante décadas, a crítica literária brasileira operou com base em valores do século XIX e início do XX — o “livro bom” é o que exige esforço, rompe com a forma tradicional, provoca mal-estar. Claro, há valor nisso. Mas o problema é quando esse é o único valor reconhecido.

E quem disse que literatura precisa ser sofrida para ser relevante?
Será que só é grande arte o que assusta ou cansa?
Será que a leveza, o humor, a fluidez não podem carregar profundidade?

Enquanto os críticos tradicionais reverenciam os “grandes mestres” e se dedicam a dissecar frases como cirurgiões da sintaxe, uma nova geração de leitores se forma no TikTok, no Instagram, nos slams e nas feiras populares. Booktubers, blogueiras, leitores de Wattpad e influencers literários criaram outro centro de poder — um que não pede permissão para gostar do que gosta.

E esse novo centro incomoda. Porque ele não segue os critérios antigos. Ele cria os próprios.


✊ Preconceito disfarçado de qualidade

Por trás da noção de “qualidade literária” muitas vezes se esconde algo mais feio: elitismo, racismo, machismo, homofobia e classismo. Não é coincidência que obras escritas por mulheres, autores negros, indígenas ou LGBTQIA+ sejam mais facilmente classificadas como “literatura de nicho”, “testemunho”, “literatura menor” — mesmo quando a linguagem é sofisticada, o enredo potente e a recepção imensa.

Quando um autor branco escreve sobre a própria dor, é autoficção.
Quando uma mulher preta faz o mesmo, é vitimismo.
Quando um autor europeu escreve sobre uma criatura mágica, é realismo fantástico.
Quando uma adolescente brasileira escreve fantasia, é bobagem.

A régua da qualidade é seletiva. E seletiva com quem sempre foi excluído.


💬 E se mudássemos a pergunta?

A questão, talvez, não seja mais “o que é literatura de qualidade?” — mas sim:
“quem está autorizado a definir isso?”
“quais vozes estão dizendo que um livro é bom ou ruim?”
“quem ficou de fora da crítica porque escreve ou lê de outro lugar?”

A literatura brasileira não precisa mais desse tribunal do gosto. Precisa de multiplicidade, de escuta, de espaço para o novo — mesmo (ou principalmente) quando esse novo vem de fora da bolha.


📌 Conclusão: A qualidade está onde o leitor sente

Chegou a hora de desconstruir a ideia de que só o difícil é legítimo.
A qualidade pode estar em um livro premiado e em um livro vendido na praça. Pode estar em Clarice Lispector e em Ryane Leão. Em Guimarães Rosa e em Geovani Martins. Em Hilda Hilst e em Jéssica Iancoski. Pode estar onde o leitor se reconhece — e isso, por si só, já é valor literário.

Não há nada mais perigoso para o sistema do que um público que lê o que quer.
E isso está acontecendo.
Com ou sem o selo de qualidade da crítica tradicional.

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