
Nascida em Porto Alegre, em 1959, Malu Baumgarten vive atualmente em Toronto, no Canadá, onde construiu uma trajetória literária e acadêmica que une sensibilidade poética, consciência política e rigor estético. Jornalista de formação, licenciada em inglês e literatura, e graduada em escrita criativa pela York University, Malu descreve a escrita como algo que “a define completamente”.
“Escrever é parte de quem sou. Minha escrita me define”, afirma. O vínculo começou na infância, ouvindo histórias lidas pela mãe e pela irmã. Quando aprendeu a ler, descobriu uma afinidade natural com a língua e se tornou uma leitora voraz. “Não há nada que tenha desejado mais do que escrever, nem nada que faça melhor”, diz.
Hoje, ela pensa na possibilidade de cursar um mestrado em Belas Artes, mas a verdade é que sua formação principal se deu na experiência: décadas de leitura, de escuta e de vida entre dois mundos — o Brasil e o Canadá.
Influências, encantamentos e o ofício da leitura
O primeiro livro que a marcou foi uma versão infantil de As Mil e Uma Noites. Depois vieram os livros de Monteiro Lobato, e, aos onze anos, Jorge Amado, que despertou nela o amor pela literatura brasileira. Seguiram-se Érico Veríssimo, Rachel de Queiroz, Cecília Meireles, Rubem Braga, Adonias Filho, entre outros nomes fundamentais.
Mais tarde, já adulta, descobriu os autores latino-americanos em espanhol — Cortázar, García Márquez, Manuel Scorza, Vargas Llosa —, lendo-os em exemplares que “roubava” da biblioteca do pai. Também mergulhou em escritores brasileiros e estrangeiros das décadas de 1980 e 1990, como Rubem Fonseca, Márcio Souza, Doris Lessing, Patrícia Melo e Luís Fernando Veríssimo.
Vivendo no Canadá, Malu passou a estudar autores locais e africanos, ampliando o repertório para vozes femininas e pós-coloniais: Margaret Atwood, Gioconda Belli, Nadine Gordimer, Elena Garro, Ursula K. Le Guin. Ela observa, com ironia, que Le Guin “vai muito além da ficção científica a que tentam relegá-la”.
No Brasil, admira Micheliny Verunschk, Itamar Vieira Junior — de quem destaca Salvar o fogo — e o gaúcho José Faleiro, autor de Os supridores. “Há muitos escritores novos e bons no Brasil, então acho melhor parar por aqui”, brinca.
E, num pós-escrito que não podia faltar, ela acrescenta: João Guimarães Rosa é possivelmente o autor que mais a inspirou — “em qualquer contexto”.
A poesia como invenário da vida
Publicado em 2023 pela editora Bestiário, o livro A poesia da hora braba / Poetry of the Wild Hour marca a estreia solo de Malu Baumgarten na poesia. A obra nasceu em um período tenso: “Foi organizada durante e logo após a pandemia, em pleno governo Bolsonaro”, recorda.
O impulso veio de uma frase lida nas redes sociais: “Estamos vivendo uma hora braba.” A expressão ficou ressoando até se transformar em verso: Viva a poesia da hora braba. O poema repercutiu fortemente entre as mulheres do movimento Mulherio das Letras, do qual a autora participa. O título do livro veio daí — e, como ela diz, “já estava dado”.
“Também acho que sou uma poeta braba, às vezes criticada por não escrever com mais doçura”, confessa com humor. O livro reúne textos escritos ao longo de décadas — poemas da juventude, composições recentes, e versos bilíngues que transitam entre português e inglês. Por isso, ela define a obra em uma só palavra: inventário. “É meu primeiro livro individual, uma antologia de mim mesma.”
Aprendizados e descobertas
Durante o processo de criação, Malu descobriu muito sobre o fazer poético — inclusive o que evitar. “Aprendi muitas coisas com A poesia da hora braba, inclusive como não fazer um livro”, ri.
Um dos textos mais marcantes da obra é Tropicália 2022, em que ela revisita, com olhar crítico, autores consagrados como John dos Passos e Elizabeth Bishop. “Para escrevê-lo, tive que aprender que Bishop desprezava o Brasil e Dos Passos era condescendente com nossa ‘inocência bem-intencionada’. Confesso que deixei de gostar de Bishop.”
Vozes, temas e identificação
Os leitores, segundo ela, se conectam de modos diferentes: uns são atraídos pelos poemas de amor, como Ariadne; outros pelo antirracismo cortante de Homem branco, um fardo; há ainda quem se encante pelo tom elegíaco de Viva a poesia da hora braba.
O livro se estrutura em seis partes e percorre afetos, perdas, pertencimentos e geografias — do Brasil a Toronto, passando por memórias do Rio Araguaia. “Acho que os leitores se identificam com minha indignação, ironia, dor e candura — e também com a crueza que às vezes aparece.”
Uma poesia que não subestima o leitor
Malu define o convite de leitura de seu livro como uma travessia intensa: “Uma leitura que varia, às vezes densa, às vezes lírica, mas que não poupa o leitor nem subestima sua inteligência.”
Mais do que uma coletânea, A poesia da hora braba é um manifesto contra a indiferença — à vida, ao outro, à Terra. “Convido o leitor a se despir desta indiferença e explorar um mundo mais solidário.”
Vulnerabilidade e compromisso
No fim, a autora se revela com clareza: “É na escrita que me apresento vulnerável, sem casca e sem máscara. Quem me lê me vê.”
Comprometida com a justiça e a compaixão, Malu afirma sem hesitar que abomina a crueldade e os bilionários. Esses valores atravessam seus versos e moldam o olhar ético que sustenta sua poesia.
Seu livro bilíngue — escrito ora em português, ora em inglês e traduzido pela própria autora — reflete esse trânsito entre mundos e idiomas, mas também entre identidades: mulher, brasileira, imigrante, poeta.
Onde encontrar
A poesia da hora braba / Poetry of the Wild Hour pode ser adquirido no site da Editora Bestiário ou diretamente com a autora pelo e-mail malubaumgarten@duck.com.
Em novembro e dezembro de 2025, Malu estará no Brasil e promete enviar exemplares autografados — para quem solicitar até o fim de outubro. “Tenho menos de dez exemplares comigo”, avisa, sorrindo.
hrosadacosta@gmail.com
diz:Fiquei honrada e feliz por estar com Malu Baumgarten em Floripa, no Encontro do Mulherio. Poeta genial, sensível e comprometida com as causas do nosso tempo. ♥🌹👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼
Fátima Farias
diz:Quero teu livro
Tu vem quando?
Novembro que dia?