Entrevista Completa Nathan Soares, autor de “Urutau”

Paulistano de 18 anos, é escritor e poeta em início de trajetória. Aborda em seus poemas temas existenciais e sentimentais, procurando explorar as palavras e seus silêncios.

Sobre você e sua relação com a escrita

1. Para começar, pode nos contar um pouco sobre você e sua trajetória como escritor(a)? Como a escrita entrou na sua vida e o que a mantém presente no seu dia a dia?

A escrita entrou em minha vida muito cedo. Acho que eu tinha 12 ou 11 anos quando comecei a escrever em diários. Nesses diários escrevia sobre meu cotidiano, mas de maneira poética, trocando elementos da realidade por elementos figurados. Quando as coisas ficavam muito complicadas e eu não sabia descrever o que sentia em uma narração, optava por descrever em poemas. Hoje sigo escrevendo em diários, mas basicamente só escrevo poemas e anotações avulsas. Penso que o que mantém a escrita presente no meu dia a dia é a necessidade de me ancorar em algo para entender a realidade, seja ela interna ou externa.

2. Quais autores, autoras ou obras foram referências importantes para você ao longo da sua vida e da sua carreira?

Tem muitos autores que são referências pra mim, nas minhas obras gosto de homenagear eles—mesmo que às vezes isso faça um poema ou outro soar derivativo— é importante para mim homenagear autores que fazem eu existir; um deles sem dúvida é Sylvia Plath. Lembro que a primeira vez que li um poema dela e algumas entradas de seu diário foi como olhar em um espelho, cada palavra ali era eu. Uma obra que li e foi uma grande referência para mim foi “Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres” assim como “A Hora da Estrela” de Clarice Lispector. Todo ano gosto de escolher um livro da Clarice para ler e absorver tudo possível dele, esses dois me levaram a lágrimas e impactaram meu jeito de ver o mundo, e de escrever. 

3. Que experiências, temas ou questões pessoais costumam aparecer na sua escrita

A minha escrita fala bastante sobre vida, morte, transformação e depressão. Falo bastante sobre a experiência de se sentir constantemente observado, reduzido e colocado em papéis que nem sempre escolhi. Falo bastante sobre autoimagem, e o peso de expectativas externas—como se tivesse crescido diante de uma plateia. 

O corpo também aparece como um território importante na minha escrita; talvez seja a peça mais central de tudo que escrevo. O corpo ferido, consumido, quebrado – e acima de tudo, resistente, por vezes, imortal. Muitas vezes trabalho com imagens de dissecação e deformidade que beira o grotesco; mas é porque sinto que esses elementos traduzem melhor o conflito entre vulnerabilidade e resistência.

É o mais importante de todos os temas: resistência. Apesar de trabalhar muito com a morte em minhas obras, sempre trabalho com a morte para no final alcançar a vida. Em vários poemas há sempre uma fagulha ou um canhão de luz de vida como no poema Um pouco de vida presente no meu livro Urutau; mesmo no limite, escrevo sobre o desejo de sorrir, respirar, se alegrar. O principal tema da minha escrita é a superação da morte, mesmo quando há o desejo de ser consumido por ela.


Sobre o livro

4. Como nasceu a ideia do seu livro e por que você escolheu exatamente esse título?

Em um momento de crise intensa, liguei para um amigo e pedi pra que ele publicasse meus poemas por mim após eu morrer; ele me respondeu “Eu não vou fazer isso porque você vai estar vivo pra fazer isso.”. Acho que isso alterou a química do meu cérebro. Alguns meses se passaram e eu percebi que ele estava certo, decidi reunir vários poemas meus desde os meus 14 anos, e então nasceu Urutau—o livro que existe porque um dia decidi não morrer; publicar ele é como dizer para o mundo todo que eu sobrevivi a morte que, por vezes, permeia as páginas. E acho que ao ler o livro, outras pessoas vão saber que não estão sozinhas em seus pensamentos macabros, mas principalmente, que há uma maneira de superar esses pensamentos.

Escolhi o pássaro Urutau como título do livro porque penso que ele é um animal mal compreendido. Existem várias lendas sobre ele e seu canto melancólico, alguns dizem que ele é um sinal de mau presságio; mas eu acho isso injusto, ele é só um pássaro que por razões longe de seu controle tem um canto assustador e melancólico. Basicamente, me identifiquei com ele; porque assim como o canto dele não existe para agradar, e sim porque precisa existir, minha poesia segue a mesma lógica.

5. Se tivesse que resumir esse livro em uma palavra, qual seria e por quê?

Sobrevivência. Mesmo que os poemas falem de dor, morte, decomposição ou vazio, o simples fato de estarem escritos é prova de que algo resistiu. O livro inteiro pulsa na borda da aniquilação e da continuação, no poema final “Vida” fica claro qual lado sobreviveu.

6. Durante o processo de criação deste livro, houve algum momento que te surpreendeu ou que mudou a forma como você via a história?

Quando eu tive a noção de que pessoas iriam ler e dar seu palpite sobre a minha obra isso mudou tudo. De certa maneira, espero ser compreendido, mas sendo realista, sei que talvez eu não vá ser. Foi assustador, me deixou paralisado de medo por semanas.  Ainda está sendo complicado lidar com isso; mas isso me deu uma nova perspectiva sobre a história, quando foi escrita isso foi um ato de resistência, sendo publicada, é um ato de coragem. Citando Carolina Maria de Jesus, “Seja o que Deus quiser. Eu escrevi a realidade.”

7. Que parte da sua obra você acredita que os leitores costumam se identificar mais? E por quê?

Gosto de pensar que as pessoas vão se identificar mais com os poemas sombrios como Corpo-Seco ou Decomposição; porque todos temos partes sombrias dentro de nós que não sabemos nomear ou explicar, e eu tenho certeza que não sou o único que já se sentiu e por vezes sente emoções sombrias e difíceis de lidar.

8. Que convite de leitura sua obra oferece a quem se dispõe a atravessá-la?

É um convite a encarar o desconforto. Não é uma travessia leve, mas é verdadeira. Convido o leitor a encontrar partes de si mesmo naquilo que escrevi, a reconhecer que, mesmo naquilo que sangra, ainda pode haver beleza e vida.

9. Onde os leitores podem encontrar ou adquirir seu livro?

No site da editora M.inimalismos! e no meu Instagram pessoal @_nathan.soares_ é possível acessar o link para o site de venda do livro e ver algumas curiosidades sobre o livro também.


Mensagem final

10. Que reflexão ou provocação você gostaria de deixar aos leitores que se aproximem do seu livro?

A reflexão que eu gostaria de deixar é que estar à beira do colapso não é o fim do mundo. Há como resistir os pensamentos destrutivos, há como transforma-los em arte; porque é muito melhor machucar o papel do que a própria pele. 

Gostaria também que entendessem o peso da performance social e como isso pode esmagar alguém; mas quero que ao invés de pensarem em mim, pensem em si mesmos como as vítimas e agentes dessas performances.  Até que ponto o rosto que mostramos é o nosso mesmo? Até onde não é doentio fingir estar bem em prol da performance? São perguntas que eu gostaria que o leitor carregasse consigo.

11. Se pudesse deixar uma última palavra ou gesto aos leitores do seu livro, qual seria?

Gostaria de dizer a eles que caso encontrem partes de si nos poemas mais sombrios presentes no livro, está tudo bem. Estar triste, ansioso, suicida, não é um crime; é uma condição humana que qualquer um está suscetível; e nessa condição, tudo que é necessário é amor, ajuda e acompanhamento de um profissional. Gostaria de deixar um abraço a todos que leram e lerão o meu livro, e um abraço a todos que acreditam no meu potencial.

12. Gostaria de acrescentar algo que não tenha sido perguntado e que considere importante compartilhar com os leitores? O que não pode faltar quando falamos de você e do seu livro?

Não, penso que está bem completa a entrevista.

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