Na noite de sexta-feira, 13 de junho de 2025, a Ria Livraria, em São Paulo, recebeu o instigante encontro “O Combo Pós-Moderno: fanatismo religioso, misoginia e desinformação”. O bate-papo reuniu nomes de peso da cena intelectual e literária brasileira para discutir os mecanismos que tornam a sociedade contemporânea tão vulnerável ao extremismo, à intolerância e às mentiras travestidas de verdade.
Com mediação da jornalista e cientista política Fhoutine Marie, o debate contou com a presença da escritora e comunicadora Vivian Retz e do pesquisador e autor Alexandre Gossn. A proposta era ambiciosa: articular vivências no campo da política, da literatura e da comunicação para refletir sobre o estado atual do Brasil — e, principalmente, perguntar se a ficção poderia ser um antídoto à desinformação.

Três frentes contra a distopia contemporânea
Durante o encontro, os convidados trouxeram perspectivas distintas, mas complementares. Vivian Retz, autora do romance Martina, falou sobre como a literatura pode ser um espaço de denúncia e memória, especialmente ao revisitar traumas da ditadura e expor a herança do patriarcado nas estruturas sociais. Também compartilhou sua experiência durante a pandemia, quando trabalhou na comunicação do Instituto Butantã e esteve na linha de frente no combate às fake news sobre a vacina.
Alexandre Gossn, por sua vez, apresentou um panorama sobre a viralização do discurso de ódio. Com base em suas obras Fascismo Pandêmico e Chapados de Cloroquina, o autor refletiu sobre como o fundamentalismo e o negacionismo tomaram formas sedutoras, especialmente nas redes sociais, e como sua trilogia de ficção Santo Adamastor busca enfrentar essas forças por meio da imaginação narrativa.
Fhoutine Marie conduziu a conversa com a precisão de quem investiga, há anos, os efeitos do neoliberalismo, da misoginia institucional e da ascensão neoconservadora sob uma lente crítica e interseccional. O público presente teve acesso a um debate que fugiu dos clichês e que se arriscou a pensar para além das soluções fáceis.
Um debate necessário
Num país ainda ferido por ondas sucessivas de desinformação, cortes de direitos e crescimento do extremismo religioso-político, o evento cumpriu uma função essencial: abrir espaço para o pensamento crítico e a escuta ativa. Ao colocar a literatura, o jornalismo e a ciência política em diálogo, “O Combo Pós-Moderno” não ofereceu respostas prontas, mas iluminou caminhos possíveis — com a palavra como resistência e a ficção como uma ferramenta de reencantamento do real.