A solidão do autor independente na Flip

Caminho pelas ruas estreitas de Paraty, ladeadas por sobrados coloniais. A Flip já me envolve antes de me ver: é um tumulto de vozes, aplausos e debates em casas literárias. A cada esquina encontro leitores animados e autores consagrados que acendem os auditórios principais. Mas, em meio a esse burburinho, sinto-me invisível, como se estivesse trancado no silêncio de uma vitrine: toda aquela energia me envolve, mas não me faz parte dela.

Além da ponte do Perequê-Açu, encontro um corredor de barracas modestas alinhadas sob lonas escuras e iluminadas por lâmpadas amarelas. O chão lamacento reflete o fraco brilho dos holofotes e a placa amarela do Auditório do Areal se destaca ao fundo. Ao cair da tarde, poucos visitantes arriscam descer até aqui: o burburinho principal ficou para trás, do outro lado do rio. Em meio à lama e às capas coloridas espalhadas nas mesas, sinto a solidão me rodear – sou um espectador mudo num canto ensopado da festa.

As conversas vibram no alto das colinas, mas minha voz mal atinge quem passa. Insisto em um ritual: fico em pé, sobre dois tocos de madeira, oferecendo meus livros com esperança. A cada sorriso daqueles que passam sem me notar, a solidão cresce um pouco mais. Somos poucos tentando existir, quase sussurrando em um canto; por mais que gritemos, continuamos invisíveis.

A estrutura da festa parece não ter sido pensada para mim. Mesmo com a Flip estabelecendo parceria com dezenas de editoras independentes, meu espaço foi empurrado para a periferia da festa. Só cheguei aqui depois de atravessar a ponte e seguir uma trilha lateral pelas praças. E o resultado é este: estamos sempre em um canto alheio, assistindo de longe o que acontece. No final, a solidão do autor independente é tanto emocional quanto estrutural – somos isolados por falta de espaço nas mesas e pelas engrenagens de um evento que pouco nos reconhece.

Quando o último visitante for embora e a cidade voltar ao seu silêncio habitual, ainda estarei aqui, dobrando páginas como sempre. Ainda invisível, talvez, mas presente – porque existimos no exato momento em que persistimos. A solidão desta experiência talvez seja amarga, mas carrega um fio tênue de esperança: é no labor silencioso do autor independente que cresce a resistência literária, feita de pequenos gestos e vozes ainda baixas. E no fim, quem sabe, esse sussurro há de se tornar canção.

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