Malu Baumgarten é jornalista, fotógrafa, autora do livro bilingue A poesia da hora braba (2023, ed. Bestiário). Participa de antologias de poesia e prosa pelo Brasil. É uma das criadoras do site Nós e Outras (noseoutras.com), que divulga a arte da mulher desde 2020. Faz parte do coletivo Enluaradas e do Mulherio das Letras. Vive em Toronto, no Canadá e não come animais.

Sobre você e sua relação com a escrita
1. Para começar, pode nos contar um pouco sobre você e sua trajetória como escritor(a)? Como a escrita entrou na sua vida e o que a mantém presente no seu dia a dia?
Escrever é parte de quem sou. Minha escrita me define. A escrita entrou na minha vida na infância, através de histórias inicialmente lidas por minha mãe e irmã. Quando aprendi a ler, descobri que tinha muita facilidade ao escrever, com a língua e com tudo que se refere a ela. Também me tornei uma leitora voraz. Para mim foi aí que me vi escritora. Não há nada que tenha desejado mais do que escrever, nem nada que faça melhor. Por conta disso me formei em jornalismo, depois em inglês (e literatura) e finalmente em escrita criativa na York University de Toronto. Meu próximo passo, se eu tiver paciência, será um mestrado de Belas Artes em escrita.
1ª. Quais autores, autoras ou obras foram referências importantes para você ao longo da sua vida e da sua carreira?
O primeiro livro a me enfeitiçar foi uma versão adaptada para crianças de As mil e uma noites. Depois vieram os livros do Monteiro Lobato, li quase todos. Aos 11 anos comecei a ler Jorge Amado e a partir daí me apaixonei pela literatura brasileira. Érico Veríssimo, Josué Guimarães, Rachel de Queiroz, Cecília Meirelles, Rubem Braga, Adonias Filho, Hermilo Borba Filho, Carlos Heitor Cony. Mais velha um pouco, descobri a literatura em espanhol, em livros que roubava da casa de meu pai: Cortázar, García Márquez, Manuel Scorza, Vargas Llosa. Nos anos noventa lia muito Márcio Souza (A condolência, Mad Maria, Galvez o imperador do Acre) e Rubem Fonseca, Doris Lessing, Patrícia Melo, Luís Fernando Veríssimo.
Já beirando a meia-idade, no Canadá, estudei e li autores canadenses, ingleses, estadunidenses, espanhóis, africanos e centro-americanos, já com maior representação de mulheres (enfim!). Margaret Atwood, Ann-Marie McDonald, Gioconda Beli, Claribel Alegría, Nadine Gordimer, Elena Garro, (mexicana, com seu magnífico Los recuerdos del porvenir, realismo mágico publicado muito antes de Cem anos de solidão. Ela nunca se uma realista mágica). Outra escritora que admiro muitíssimo é Ursula K. Le Guin, (The Left Hand of Darkness) que vai muito além da ficção científica a que tentam relegá-la. No Brasil, me junto ao coro dos amantes de Micheliny Verunschk e Itamar Viera Junior (o tal que disseram que não é literatura – meu favorito dele é Salvar o fogo.) Na minha terra, Porto Alegre, José Faleiro com Os supridores. Há muitos escritores e escritoras novos e bons no Brasil, então acho melhor parar por aqui.
2. Que experiências, temas ou questões pessoais costumam aparecer na sua escrita?
Minha escrita, poesia e prosa, fala do amor no sentido amplo, de (in)justiças e crueldades, da conexão com a terra e o meio ambiente, e das questões universais do ser humano, uma pitada de filosofia, outra de ironia, um tanto de indignação, colheradas de dor e por aí vai. Escrevo como mulher, calcada na minha experiência de gênero, brasileira, cidadã de segunda num país de primeira, mas sem esquecer os privilégios de que desfrutei devido à cor da pele e à educação. Hoje em dia, também escrevo como velha, o que é muito libertador.
Sobre o livro
3. Como nasceu a ideia do seu livro e por que você escolheu exatamente esse título?
Meu livro foi organizado durante e logo após a pandemia, em pleno governo Bolsonaro. Eu participava do Sarau da Invencionática, online, a partir de Porto Alegre com escritores brasileiros pelo mundo. Já havia publicado três histórias na Coletânea O mundo ao redor, da editora Bestiário (2021). Fui convidada por Manuela Dipp, editora do selo Invencionática, e Roberto Prym, da Bestiário, a publicar meu livro solo.
Na época, alguém que conheço escreveu na mídia social que “estamos vivendo uma hora braba”. Absorvi aquele sentimento e escrevi Viva a poesia da hora braba. O poema causou impacto entre as mulheres do Mulherio das Letras, movimento do qual faço parte. Quando decidi fazer o livro, para mim o nome já estava dado. Também acho que sou uma poeta braba, às vezes criticada por não escrever com mais doçura.
4. Se tivesse que resumir esse livro em uma palavra, qual seria e por quê?
Inventário, porque é meu primeiro livro individual.
5ª. Durante o processo de criação deste livro, houve algum momento que te surpreendeu ou que mudou a forma como você via a história?
Aprendi muitas coisas com A poesia da hora braba, inclusive como não fazer um livro. Afinal, ele tem os pecadilhos de uma primeira obra, e é também uma antologia de mim, poesia recente misturada com o material das gavetas da juventude.
Há um poema, Tropicália 2022, em que critico escritores americanos amados pela crítica, como John dos Passos e Elizabeth Bishop. Para escrevê-lo tive que aprender como Bishop desprezava o Brasil e dos Passos era condescendente com nossa “inocência bem-intencionada”.” Confesso que deixei de gostar de Bishop.
5. Que parte da sua obra você acredita que os leitores costumam se identificar mais? E por quê?
Acho que os leitores se identificam com minha indignação, ironia, dor, candura e mesmo crueza. Alguns amam os poemas de amor, como Ariadne, outros o antirracismo cerebral de Homem branco, um fardo, outros o amor pela terra de Quilombo, ou Cadê meu carnaval, ou a elegíaca Viva a Poesia da hora braba, enfim, é um livro composto de seis partes que trazem temas e momentos tão diferentes como a perda de pessoas amadas, o amor pelo Brasil e por Toronto, aventuras no Rio Araguaia. Leitores sentiram-se atraídos por temas e estilos diferentes.
6. Que convite de leitura sua obra oferece a quem se dispõe a atravessá-la?
Uma leitura que varia, às vezes densa, às vezes lírica, mas que não poupa o leitor nem subestima sua inteligência.
7. Onde os leitores podem encontrar ou adquirir seu livro?
Aqui:
https://www.bestiario.com.br/livros/poesia_da_hora_braba.html
ou comigo pelo meu email:
malubaumgarten@duck.com (em novembro e dezembro de 2025 estarei no Brasil e poderei remeter encomendas de livros autografados). Os interessados devem me contatar antes da última semana de outubro para que eu leve os livros do Canadá. Tenho menos de dez exemplares deste livro.
Mensagem final
10. Que reflexão ou provocação você gostaria de deixar aos leitores que se aproximem do seu livro?
Meu livro é um manifesto contra a indiferença ao outro e à vida na terra. Convido o leitor a se despir desta indiferença e explorar um mundo mais solidário.
11. Se pudesse deixar uma última palavra ou gesto aos leitores do seu livro, qual seria?
É na escrita que me apresento vulnerável, sem casca e sem máscara. Quem me lê me vê.
12. Gostaria de acrescentar algo que não tenha sido perguntado e que considere importante compartilhar com os leitores? O que não pode faltar quando falamos de você e do seu livro?
– Meu livro é um livro bilíngue, escrito ora em português, ora em inglês e depois traduzido para a outra língua.
– Quando se fala de mim, deve-se saber que sou comprometida com a justiça e a compaixão e abomino a crueldade e os bilionários. Estes valores se refletem na minha escrita.
helenadeldiablo@gmail.com
diz:Malu, um presente te encontrar. Que as horas brabas, também possam ser ternas. Abraço